bruna ribeiro
Aos 33 anos Bruna Ribeiro coleciona uma grande história no Jiu-Jitsu. Faixa preta pela equipe Atos, Bruna é uma das poucas mulheres que podem bater no peito e se orgulhar de ser dona de sua própria academia, a Strong Inside, em Ribeirão Preto, interior de São Paulo.
"As pessoas costumam conhecer os atletas pelos feitos dentro das competições, lutas marcantes, títulos, equipes. Porém, eu acredito que além de incríveis momentos dentro do tatame, cada um traz consigo uma trajetória cheia de histórias, acontecimentos significativos que tem valor único para cada atleta e talvez poucos saibam. Para mim, um lutador é muito mais do que mostram seus resultados, vitórias ou derrotas. Existe um caminho para cada faixa, para cada competição e pode acreditar, muitas das vitórias estão neste percurso”, diz Bruna.
Falar sobre o jiu-jitsu com ela é falar sobre sua força. Uma força que não dá pra ser mostrada numa pegada, na pressão de passagem de guarda, nem esteticamente por musculatura. É uma força que não se pode medir, que vem de dentro e sempre estará viva em Bruna.
Bruna Ribeiro dividindo o pódio do Mundial da IBJJF com Michele Nicolini e Kyra Gracie
Bruna Ribeiro no comando da maior academia de Jiu-Jitsu de Ribeirão Preto
“Falar do jiu-jitsu na minha vida é falar sobre a minha mãe”, se emociona.
Ávida praticante de esportes, conheceu a arte suave aos 15 anos. Foi identificação instantânea! Mas não foi algo muito bem aceito, afinal ela era uma menina, adolescente, numa turma cheia de homens fazendo jiu-jitsu. Apesar de seus pais sempre a incentivarem, eles ficaram um pouco bravos no começo. “Acredito que muitas atletas mulheres já passaram por alguma situação de preconceito, ou de falta de incentivo, apoio, patrocínio, desvalorização, etc”, afirma.
Bruna começou a treinar em São José do Rio Preto, e é aí que sua mãe já entra na história. Nesta mesma época ela descobriu um tumor no seio. Era algo simples, tratamento tranquilo, mas esse nome, câncer...sempre assusta. Porém ela transmitia tranquilidade, muita segurança e era determinada, fez tudo o que precisava fazer e pronto! Bruna passava horas na academia se distraindo e treinando durante este processo, quando sem nem perceber sua mãe estava curada na mesma época em que a jovem atleta conquistava o Estadual da FESP na faixa branca, garantia uma prata na Copa do Mundo CBJJO na faixa azul e passava no vestibular para Educação Física na UFSCar.
O tempo passou e Bruna estava prestes a estrear na categoria marrom-preta quando recebe mais uma notícia, dessa vez, muito mais preocupante: no dia 23 de dezembro de 2009 sua mãe foi diagnosticada com câncer no fígado.
Mais uma vez Bruna focou nos treinos para poder manter-se centrada e poder apoiar sua mãe.
O ano de 2010 foi de muitas derrotas no esporte, conquistando medalhas de bronze no Campeonato Mundial da IBJJF e na Seletiva de Abu Dhabi em Natal. “Ao mesmo tempo, foi o ano em que eu mais me levantei. Aprendi a não desistir. Cada vez que eu perdia, eu voltava a treinar muito mais forte e concentrada. Treinava muito em Rio Claro com o mestre Ramon Lemos, Mendes Bros e toda galera da Atos. Poucos sabiam da minha vida pessoal. Eu estava lá me esforçando e aprendendo o máximo que eu poderia. Paralelo a isso, eu estava desenvolvendo meu mestrado e em 2011 eu o conclui logo no início do ano. Lutei Pan, Mundial, Seletivas, ganhei diversos campeonatos no Brasil, lutas casadas, resumindo, consegui bons resultados”, lembra.
Devido ao meu desempenho em todo o ano e inclusive nos treinamentos, Bruna seria graduada a faixa-preta no final do ano junto com toda a equipe. Mas a saúde da sua mãe estava pior. Bruna viu em sua mãe uma verdadeira guerreira, que não desistiu de nenhuma tentativa, e lutou até o fim pela sua vida.
“Quando tive consciência da real situação, acabei largando tudo e fiquei ao lado dela. Eu e minha família passamos semanas e mais semanas sem dormir. Lembro de me esquecer de comer várias vezes, mas nunca me esquecia de ajudar minha mãe a comer. Cada dia de vida era uma vitória e uma oportunidade de ouvir suas palavras, receber e dar carinho. Dia a dia as coisas foram ficando mais difíceis e eu tomei uma atitude que chegou a me assustar... enviei uma mensagem para meu professor e disse: ‘Eu sei que seria graduada junto com toda a equipe em dezembro, mas queria te pedir para adiantar a minha graduação...porque eu não sei como será o dia de amanhã e eu quero que ela saiba que eu consegui.’
Sabendo de toda a situação, ele foi super compreensivo e marcamos para aquela semana mesmo a minha graduação. Meu professor, Tatinho, leu uma carta enviada pelo Guilherme Mendes especialmente para aquele dia, falou sobre minha vida para os alunos e lembro de abraça-lo sem força alguma enquanto ele amarrava a faixa preta na minha cintura. Corri para casa para tentar pegar minha mãe ainda acordada sem efeito de remédios e mostrar a faixa pra ela. Sentei na sua cama e ela toda feliz: ‘Nossa filha, é linda né? Parabéns!’. Eu havia conseguido, ela me viu realizar um sonho! Após 15 dias minha mãe se foi, em paz, tranquila...no dia 21 de outubro de 2011”, relembra.
E Bruna lembra dos problemas que viriam. “Confesso que demorou um pouco para cair a ficha...e quando caiu, eu percebi que tinha ido com ela toda minha vontade de lutar. Exatamente nessa fase recebi um convite que mudou tudo pra mim: minha querida amiga Angélica Galvão estava se preparando para o calendário de 2012 e me convidou para treinar 1 mês em San Diego sob o comando de ninguém menos que André Galvão. O óbvio seria pensar: caramba, que oportunidade!!! Mas eu só conseguia sentir medo. Será? Será que é isso? Será que eu vou? Era tudo muito recente ainda e eu mal conseguia ficar um dia sem chorar. Até que uma grande amiga e convém falar, psicóloga, me disse: ‘Bruna, sua mãe lutou e a luta dela acabou. Agora você precisa decidir se quer continuar lutando, lutando jiu-jitsu, e se decidir que quer, precisa encontrar um novo sentido para isso’. Decidi ir”, conta.
No fim ela acabou ficando 3 meses em San Diego o que lhe rendeu o título Panamericano e o 3º lugar no Mundial peso pena. “Durante todo o camp vinha o pensamento de desistir, tanta dor no corpo, tantos altos e baixos psicológicos que eu nem acredito que consegui passar por tudo”, lembra.
Hoje Bruna põe suas forças na academia Strong Inside, nome este que surgiu com sua dura história de perda. “Minha história não é mais fácil ou mais complicada do que a de ninguém. Eu acredito que cada um sabe o valor que tem cada passo dado. Eu valorizo o que o jiu-jitsu me proporcionou e me proporciona até hoje. Eu me levantei, renasci de kimono e dentro do tatame. Sou feliz em poder contribuir com novas histórias. Eu me esforço para transmitir algo de bom e colaborar com a história de cada pessoa que entra no tatame que eu dou aula ou que acompanha minha trajetória. Você só sabe a força que tem até que a sua única alternativa é ser forte. Ser forte é muito, muito mais do que aparência. Eu sou forte por dentro, eu sou Strong Inside", afirma Bruna Ribeiro.